"Recentemente Grein lera um trecho da pesquisa do doutor Kinsey, que em breve seria publicada em forma de livro, segundo a qual o homem atinge o máximo de potência sexual entre os cinqüenta e sessenta anos, mas o que estava acontecendo entre ele e Anna provava que isso não era verdade. Ela despertara nele um vigor aparentemente inédito. Como era possível efetuar uma medição geral de um poder que irrompia das profundezas do inconsciente, da essência que não é mais aparência e sim a coisa-em-si? [...] Anna repetia as mesmas palavras sem parar: "Eu amo você! Eu amo você! Até a morte! Até a morte!". Ofegante, ela falava descontroladamente polonês, como no tempo em que Grein era seu professor particular, gemendo as palavras violentas e voluptuosas que emergem daqueles que estão física e espiritualmente despidos: frases pelo meio, exageros absurdos, repetições insensatas. Não eram Grein e Anna que se uniam, e sim um poder mais elevado que, por meio do mistério do magnetismo espiritual, tornara-se uno, após uma prolongada
Estar efetivamente nu é estar só. Só, naquele ponto em que sua torrente de pensamentos enfraquece e uma matéria orgânica ocupa lugar no espaço; e o tempo deixa de existir tal como temos nos habituado. O tempo "relógico", instrumentalizado, funcional, estupidamente prático, tediosamente estático, cede lugar ao tempo escondido em um bom livro como esse de Singer, no intervalo entre a indignação de saber-se pessoa física em um mundo injusto e o cansaço de realizar tarefas que não haverão de interferir nele.
É aí que chega essa bela cena de Singer, ao fundo de um sentimento atávico, e que interpretamos tão mal. A espantosa nudez física e espiritual de Anna, potencialidade de seu corpo vivo, é também a força de um sujeito "em-si" porque é o êxtase amoroso vivenciado com outro sujeito único, o seu antigo professor, e não poderia haver outro; o homem pelo qual deixou o marido, o pai, a religião. Sentimento de Nudez implicado no de Verdade. Sentimento que anula a superficialidade do impulso ao consumo, que termina com certa desagradável sensação de ser um insignificante elo entre a loja e o lixo. Tempo repetido, desperdiçado, tempo que viola, sem piedade, a História, irmanamente repartindo-a entre os irmãos Trabalho e Consumo, esses que nunca atingem o selvagem coração da Vida, disponível para aqueles que tiverem a grande felicidade do amor romântico; e esses são poucos, e esses não passam, para lembrar de um episódio de Arquivo-X, de cegonhas entre gravetos. É o que eu acho, é o que eu acho.